Escritores também vão à praia

Publicado em 11/08/2017 às 19:30

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Era apenas mais uma foto em uma rede social. Dia ensolarado, a linda praia de Copacabana e um cara fazendo pose para a lente de um celular. Mais um clichê que passaria batido se não fosse um detalhe: o cidadão em questão é um escritor. E o escritor, sou eu. Sim, amigo leitor. A despeito da excessiva alvura da minha tez e das toneladas de papéis que eu já escrevi, eu também vou à praia. Como qualquer pessoa que se preze neste mundo.

Desde quando abracei a carreira literária, percebo um certo encantamento para com o metiê de autor. Não sei se é por sermos um país em que a televisão entrou nos lares antes da biblioteca ou por causa do nosso ensino de literatura, que sempre privilegiou o dito cânone, os autores “exemplo”, independente se apropriados ou não para o aluno. Ler um “clássico” sempre foi sinônimo de algo “difícil”, para “iniciados” e, em última análise, “chato”. Tudo contribuindo para tornar a imagem do escritor como um ser distante, um cultor de palavras complicadas, alguém que, antes de levantar a pena, precisa pedir bênção às musas.

Eu não conseguiria ser autor de uma linha sequer se não estivesse inserido na minha realidade. Aliás, eu, Machado, Victor Hugo, Emily Brontë ou Cecília Meireles. Tirando o fato de eu ser o único vivo dessa lista, Machado era gago e epilético; Hugo padeceu com sua filha Adèle, que nutria uma paixão doentia por um oficial inglês; Brontë era extremamente introvertida; e Meireles amargou um casamento malogrado, vindo a se casar outra vez. O que significa: todos eles foram humanos e, como tais, sofreram as dores e as delícias de passar por este mundão de meu Deus! Eu, por enquanto, continuo a caminhada.

Um pouco desse aparente estranhamento com os escritores pode se dar pelo próprio ofício da palavra. Escrever, de fato, não é uma coisa fácil. Requer tempo, recolhimento (algo cada vez difícil nesta era de smartphones). Às vezes, mexe com os sentimentos da gente. Mas não é coisa de outro mundo. É possível para qualquer um. É um exercício e, como tal, necessita prática. E leitura. Não é possível ser escritor sem antes ser um leitor. Em tempo: para ser escritor, não é necessário “decorar o dicionário” ou “ser um erudito”. Um ótimo exemplo é Maria Carolina de Jesus: empregada doméstica, favelada. Sim, leitor. Tem gente que também produz literatura na periferia. E produz bem.

“Não acredito, um escritor!”, me escreveu um; “Mas você é um acadêmico”, me disse outro. Bom, se nada do que eu escrevi convenceu você, recomendo conferir o blog Homo Literatus. Nele, há uma postagem bem humorada de título “11 fotos de escritores sensualizando na praia”. Piadas à parte, a publicação tem como objetivo humanizar os autores. E não são “ilustres desconhecidos” como eu, mas gente do calibre de Kafka, Neruda e até uma estonteante Clarice Lispector, nas areias de Ipanema. Viu? Escritores também vão à praia e, enquanto você revê os seus conceitos, vou ali dar um mergulho e já volto.

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