Mulheres do mundo se unem em Nova York para debater igualdade de gênero e direitos femininos
Publicado em 11/03/2025 às 15:12

Foto: Juan Seguí Moreno/Flickr
Milhares de mulheres de diversas partes do mundo estão reunidas em Nova York para avaliar e revisar a Declaração e a Plataforma de Ação de Pequim, o maior tratado multilateral sobre igualdade de gênero e empoderamento de mulheres e meninas.
A 69ª Comissão sobre a Situação das Mulheres (CSW69) acontece na sede das Nações Unidas (ONU) e se estende até o dia 22. Para Maria Aparecida Schumaher, coordenadora da Rede de Desenvolvimento Humano, o cenário global acentuou ainda mais as divisões entre os hemisférios, tornando fundamental o debate sobre os avanços feministas.
“Estamos enfrentando uma realidade desafiadora, com retrocessos em todo o mundo. A onda conservadora se expandiu, infelizmente. A delegação brasileira está bem preparada e conta com forte participação da sociedade civil, mas as decisões não dependem apenas do Brasil. Outros países adotam posturas conservadoras, e em muitos casos há retrocessos”, afirma Schumaher.
Relatório
A CSW ocorre logo após a divulgação de um relatório da ONU Mulheres, que avaliou os últimos cinco anos da Plataforma de Ação de Pequim. O estudo revelou que em um quarto dos 159 países analisados houve retrocessos nos direitos femininos.
O relatório brasileiro destacou conquistas importantes, como as leis Maria da Penha, do Feminicídio e da Igualdade Salarial, além de políticas públicas voltadas à equidade e ao combate à fome. No entanto, apontou também desafios persistentes.
Para Schumaher, a consolidação de avanços exige um esforço contínuo das mulheres. “Não se trata apenas da implementação de políticas, mas também da mudança de mentalidade e do respeito aos direitos humanos, independentemente de raça, etnia, gênero, orientação sexual ou território. Muitas vezes, damos cinco passos à frente e recuamos quatro”, observa.
Desigualdades
Ana Carolina Querino, representante da ONU Mulheres no Brasil, destaca que o progresso nas leis e políticas públicas precisa ser acompanhado de um aprimoramento na produção de dados científicos e estatísticos. “Só é possível fundamentar o debate público com base em evidências e análises interseccionais, para compreender a situação das mulheres em sua diversidade, incluindo mulheres negras, indígenas e quilombolas, como revelado no último Censo”, explica.
Embora a evolução seja mais lenta do que o desejado, a Plataforma de Ação de Pequim continua sendo uma conquista relevante, segundo Wania Santana. “Trata-se de um documento amplo e ainda atual, apesar da necessidade de aprimoramentos em temas que avançaram, como o combate ao racismo e os direitos da população LGBT+”, ressalta.
Histórico
A criação do tratado internacional há 30 anos representa um marco na mobilização social feminina. “Na época, vivíamos um período de intensa organização política, o que permitiu mobilizar mulheres de todos os estados brasileiros para a criação dos fóruns estaduais de mulheres, culminando na Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB) Rumo a Pequim”, relembra Wania Santana.
A pesquisadora participou da 4ª Conferência Mundial da Mulher, realizada em Pequim, em 1995, tanto na delegação oficial brasileira quanto no fórum social, que contou com mais de 300 representantes do país. “O feminismo e a organização das mulheres estavam ressurgindo. Muitos países haviam passado por regimes ditatoriais, dificultando a expressão política, e aquele era um momento propício para a participação social”, afirma Schumaher.
No Brasil, a familiaridade com conferências da ONU ganhou força após a Eco-92, no Rio de Janeiro. Em 1995, um encontro com 900 delegadas de todo o país resultou na “Carta das Brasileiras para a 4ª Conferência Mundial sobre a Mulher”, enviada ao governo brasileiro.
União
A atuação da delegação brasileira foi fortalecida pelo apoio de movimentos feministas da América Latina. Diversos debates promovidos por esse bloco foram incorporados à Declaração de Pequim, incluindo os direitos sexuais e reprodutivos e a punição de mulheres por questões relacionadas à saúde reprodutiva. “Esse foi um grande embate, pois na Conferência do Cairo, em 1994, houve avanços nesse tema, mas o Vaticano tentou impedir que essas propostas fossem incluídas na Plataforma de Pequim”, explica Schumaher.
As ativistas que representaram o Brasil na luta pelos direitos femininos há 30 anos reconhecem que os desafios atuais são diferentes, mas reafirmam seu compromisso com a resistência diante de possíveis retrocessos. “Não podemos permitir retrocessos nos mecanismos institucionais voltados às políticas para as mulheres, como ministérios e secretarias. Também não podemos perder direitos conquistados em áreas como comunicação, meio ambiente e proteção de meninas e adolescentes”, enfatiza Wania Santana.
Ela conclui com um alerta: “Não seremos abatidas como ovelhas em um campo desprotegido. A luta continua”.
Fonte: Fabíola Sinimbú – Repórter da Agência Brasil