Vamos voltar a vaca fria?

Publicado em 12/03/2018 às 12:58

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Antigamente (ou, não tão antigamente assim), eu ria quando uma adulta me chamava de “pão”. Hoje, o adulto sou eu e, anda, vira e mexe, sou motivo de riso quando utilizo, principalmente, com meus alunos, a expressão “vamos voltar à vaca fria?”. Riso para eles, espanto para mim: essa meninada de vinte e poucos não faz ideia do que isso significa. Será que essa nova geração perdeu o senso de abstração ou sou eu quem, de uma hora para a outra, ficou velho, mesmo?

Se você faz parte do mesmo time dos meus alunos, explico: “vamos voltar à vaca fria” é uma expressão utilizada quando queremos retomar um assunto anterior, dito pela metade. Ao que parece, a expressão vem da francesa revenons à nos moutons (ao pé da letra, “voltemos aos nossos carneiros”), originária da peça “A farça do Dr. Pathelin”, de 1485. Pathelin, advogado de expedientes duvidosos, cria, durante o processo do roubo de alguns desses animais, uma história tão absurda que Joceaulme, a outra parte, grita ao juiz: “voltemos aos nossos carneiros!”. Ao que parece, a expressão migrou para Portugal, que mudou o bicho por conta de um prato de carne fria de vaca, comido por lá e, de lá, veio até o Brasil.

Eu, particularmente, adoro expressões idiomáticas por dois motivos: o primeiro, elas são indissociáveis a como um povo vê o mundo. O exemplo do parágrafo anterior ilustra bem isso. O segundo, elas trazem o espírito do tempo. Esses dias, eu estava pensando em como a gente tem expressão inspirada no futebol, neste país: “me deu bola”, “bola fora”, “pisou na bola”, “bater um bolão”, ‘show de bola”, “entrar em campo”, “cartão vermelho”, “gol de placa” e por aí vai. São tantas que, às vezes, traduzir fica impossível (e, aí, dependendo da língua, vai da criatividade do tradutor). Em tempo: o francês tem a mesma expressão “pendurar as chuteiras”: accrocher les crampons. Seria uma influência desse nosso futebol exportação? Quem sabe!

Mais apaixonado por televisão do que por leitura, o brasileiro costuma empregar bordões folhetinescos, geralmente, com prazo de validade até o fim da novela. Alguns, até, de outros idiomas: “não é brinquedo, não”, “arebaba”, “inchalá”, “mistério” e por aí vai. Mas a campeã de bordões, sem dúvida, é a publicidade. Se você conhece a expressão “bonita camisa, Fernandinho”, certamente você também conhece a “vaca fria”. Da mesma forma “não é uma Brastemp”, “a primeira faz tchan, a segunda faz tchun…” ou “Tomou Doril”. E, se você for do meu estado, vai se lembrar de “Quer moleza? Vai no Balaio”. Quer dizer, se você regular a minha idade, né?

Aos mais novinhos: antigamente, quando um rapaz era bonito, a turma o chamava de “pão”. Se fosse uma moça, “broto”. Não, isso não é do meu tempo. Para mim, “pão” é “gato” e “broto” é “gata”. Mesmo assim, ao que parece, já virei peça de museu. Gato, agora, é “sapão” e gata é “tiro”. Deixei alguns amigos duplamente espantados quando lhes ensinei isso, mas, principalmente, quando usei. Crise dos 40 chegando? Pode ser. Mas, achando que eu já estava moderno, soltei um “navegar na internet”, causando o riso dos meus alunos. Chamei a atenção, logo em seguida: “Vamos voltar à vaca fria?” Ninguém entendeu nada.

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