Meu amigo François

Publicado em 30/12/2016 às 16:27

Compartilhe

Eu sempre achei que os franceses, até hoje, pensam o Brasil como uma espécie de Éden Perdido, um paraíso nos Trópicos, cheios de animais e plantas exóticas, onde o sol brilha o ano todo e a tristeza não existe. Tantos foram os viajantes que botaram aqui os pés, a vida toda ou por pouco tempo: Villegagnon, Jean de Léry, Debret, Lebreton, Claude Lévy-Strauss, dentre tantos. Mas é de para um viajante contemporâneo que eu dedico esta crônica. O meu amigo François-Mary Boureau.

Conheci François antes de conhecê-lo. Um belo dia, em uma rede social, recebo o convite de um tal de “Labasoche Francis”. Meio desconfiado, dei uma olhada para ver quem era e logo percebi que se tratava de um francês, que vinha adicionando os vários amigos em comum da Aliança e deixando mensagens em um texto escorreito, que só um nativo ou alguém muito próximo de um poderia escrever.

Conversa vai, conversa vem, e nós marcamos um encontro no lançamento do meu “O Livro dos Poemas”, de 2013, na Escola de Artes Fafi, no Centro de Vitória. A ocasião não poderia ser melhor: unimos literatura com francofonia. E foi assim que eu vi aquele jovial senhor, alto e elegante, educadíssimo, ao lado da esposa brasileira, uma simpática descendente de japoneses, vinda de São Paulo. O nome dele: François. Nada mais francês. O dela, Marina, sua paixão pelo resto da vida.

Nossa amizade se unia pelo amor pela língua francesa. Isso foi crucial para fazer com que François e Marina se sentissem cada vez mais acolhidos nesta terra capixaba, que tanta gente recebe de braços abertos. Apesar da forte presença italiana, o Espírito Santo teve uma grande influência cultural francesa, que data da segunda metade do século XIX. Isso é tão verdade que, antes de haver um hino e uma bandeira capixabas, cantava-se aqui a Marselhesa e usávamos a bandeira francesa. E com tantos edifícios de nome francês, François e Marina, cansados do ritmo paulistano, não pensaram duas vezes em se fixar aqui.

Com o tempo, nossa amizade se tornou, praticamente, uma irmandade. Foi essa “família de amigos” que lhe deu o suporte quando ele perdeu a mulher; e não só isso, mas que cuidou de toda a burocracia, estando nos maus e nos bons momentos que, no saldo, foram maiores. E porque nosso François não negava a tradição culinária francesa, nós nos uníamos, mensalmente, na casa de um dos amigos, para apreciar as iguaria que ele fazia. Ele e todos nós. Exceto eu, claro. Que não sei nem fritar um ovo!

Aos 72 anos, ele estava mais ativo do que nunca. Capitaneava um webjornal, o “Brésil-Infos” e vivia na ponte aérea Vix-Rio-SP-França. No final, comprou uma câmera ultramoderna, que usaria após visitar as filhas na França, Sophie, Virginie e Julie, seus três tesouros. Eu o estava esperando, ansiosamente. Havia escrito um romance em francês. Ele estava revisando. Tínhamos marcado um vinho “nacional”, como eu brincava. Não foi possível, no entanto. Ele me pediu um tempo, pois havia ingerido sardinhas com salmonela e estava se sentindo muito fraco, incapacitado em receber visitas.

Eu iria proferir uma palestra sobre a “Missão Francesa” de 1816 e resolvi convidá-lo. Nada mais apropriado. Mandei uma mensagem, mas ele não respondeu. Mandei de novo. Achei aquilo estranho. Escrevi para uma amiga em comum. Nada. Quase fui à casa dele. Até que, uma semana antes do evento, recebo um telefonema de outra amiga, da França. François havia morrido em casa. Provavelmente, vítima de uma queda, o organismo enfraquecido.

Não foi apenas a tristeza de perder um amigo, mas todo um problema burocrático, que envolveu um amigo do Consulado de SP e uma amiga do Vice-Consulado daqui, além de algumas “desventuras”, aumentando ainda mais o sofrimento das filhas. A alegria (porque, sim, há também essa perspectiva), foi ter ganhado novos amigos. Hoje, nosso amigo François descansa ao lado da mulher que tanto amou, nesta terra de que ele sempre dizia “Chez moi est ici” (Minha casa é aqui).

Version française:

J’ai toujours cru que les français trouvent le Brésil, jusqu’à présent, une sorte d’Eden perdu, un paradis dans les tropiques, plein d’animaux et de plantes exotiques, où le soleil brille toute l’année et la tristesse n’existe pas. Tant de voyageurs ont mis leurs pieds ici pour la vie ou peu de temps: Villegagnon, Jean de Léry, Debret, Lebreton, Claude Lévy-Strauss et beaucoup d’autres. Mais ce récit est dédicacé à un voyageur contemporain. Mon ami François-Mary Bourreau.

J’ai connu François avant de le connaître. Un beau jour, dans un réseau social, je reçois l’envitation d’un tel “Labasoche Francis”. Un peu méfiant, j’ai jeté un coup d’oeil pour voir qui était et du coup je me suis rendu compte qu’il s’agissait d’un français qui ajoutait plein d’amis en commun de l’Alliance Française, en laissant des messages dans un français soutenu qui seul un natif ou quelqu’un de très proche pourrait l’avoir.

Après beaucoup bavarder, on s’est donnés rendez-vous dans le lancement de mon “O Livro dos Poemas” (“Le livre des Poèmes”, en traduction libre), de 2013, dans l’École d’arts Fafi, dans le centreville de Vitória. L’occasion ne pourrait pas être la meilleure: nous avons unis littérature et francophonie. Et c’était comme ça que j’ai fait connaissance de ce grand, élégant et polissime monsieur, accompagné de son épouse brésilienne, une sympatique descendente de japonais, issue de São Paulo. Son prénom: François. Rien de plus français. Marina était celui de sa femme, passion de sa vie.

Notre amitié s’unissait par l’amour de la langue française. Cela fut essentiel pour que François et Marina se croient de plus en plus accueillis dans notre terre capixaba, qui reçoit tant de gent les bras ouverts. Malgré la forte présence italienne, l’Espírito Santo a subi une grande influence culturelle française qui date de la seconde moitié du XIXème siècle. Cela est tellement vrai qu’avant la création d’un hymne et un drapeau capixaba, on chantait la Marseillaise et utilisait le drapeau français. Et avec davantage de bâtiments avec des noms français, François et Marina, fatigués du rythme de São Paulo, n’ont pas pensé deux fois à demeurer ici.

Notre amitié est devenue un fraternité avec le temps. C’était cette “famille d’amis” qui a donné du soutien à François quand il a perdu sa femme; et non seulement ça, mais qui s’est occupé de toute la bureaucratie, étant à côté de lui dans les mauvais et les bons moments, ceux-ci, si l’on fait un bilan, plus nombreux. Et puisque notre François connaissait bien la tradition de la gastronomie française, on se rencontrait chez les amis, mensuellement, pour apprécier un beau plat qu’il faisait y compris tous les autres. Sauf moi qui suis complètement nul à la cuisine!

À l’âge de 72 ans, il était plus actif que jamais. Était le redacteur en chef du web journal “Brésil-Infos” et faisait fréquemment la route Vix-Rio-SP-France par avion. Finalement, il s’est acheté une caméra super moderne, qu’il utiliserait après la visite à ses deux filles en France, Sophie, Virginie et Julie, ses trois trésors. Je l’attendais impatiemment. J’avais écris un roman en français. Il en faisait la révision. Nous nous sommes donnés rendez-vous pour un verre “national”, comme je disais. C’était impossible, pourtant. Il m’a demandé d’attendre car il avait mangé des sardines avec des salmonelles et il se sentait très faible, incapable d’avoir des visites.

J’allais proférer une conférence sur la “Mission française” de 1816 et j’ai décidé de l’inviter. Rien de plus approprié. Je lui ai envoyé un message, mais il ne m’a pas répondu. Je lui en ai envoyé un autre de nouveau. J’ai trouvé bizarre. J’ai écris à une amie commune. Rien. Je suis presque allé chez lui. Du coup, une semaine avant la conférence, j’ai reçu un coup de téléphone d’une autre ami, en France. Francois était mort chez lui. Probablement victime d’une chute, l’organisme affaibli.

Ce n’était pas seulement la tristesse de perdre un ami, mais tout un problème bureaucratique qui a entouré un ami du Consulat de SP et une amie du Vice-Consulat de Vitória, en plus de quelques “mésaventures”, ce qui rendait plus grande la souffrance des filles. Le bon côté (car il y en a toujours un bien sûr) a été celui d’avoir fait de nouvelles amitiés. Aujourd’hui notre ami François reste à côté de la femme qu’il a tant aimé, dans cette terre à propos de laquelle il disait toujours: “Chez moi est ici”.

Veja também

brasil-07-05-ft-div-Marinha-do-brasi

Marinha envia nesta terça hospital de campanha ao Rio Grande do Sul

politica-07-05-Foto-Helio-Filho-Secom

Governo do Estado lança edital com R$ 10 milhões em recursos para pesquisa agropecuária

geral-07-05-freepik

Decreto prevê concessão de benefícios tributários a empreendedores capixabas afetados pelas chuvas

agro-07-05-Foto-Vanessa-Capucho-incaper

Feira facilitará acesso de pecuaristas do norte capixaba a touros melhoradores

cultura-06-05-pmdm

Prefeitura busca empresa para restaurar a Casa da Cultura de Domingos Martins

geral-06-05-banestes

Banestes lança Inteligência Artificial Generativa própria em parceria com startup capixaba

Close up view of driving instructor holding checklist while in background female student steering and driving car.

Detran|ES divulga lista de selecionados no programa CNH Social 2024

geral-06-05-ft-gov-es

Espírito Santo envia segunda equipe de bombeiros para o Rio Grande do Sul